O rebanho eleitoral : Albert Libertad, 1906. L’Anarchie
Nota de Cumplicidade:
Mais de cem anos passaram desde que esse texto foi publicado e hoje, dia de eleições nesse território, onde as massas se dirigiram nas urnas, fazendo filas para escolher qual dos dois babacas vai dirigir as suas vidas, não é demais ressaltar a pertinência das palavras de esse Anarquista para quem, já nessa época, as eleições não fazia o menor sentido….
Retirado do site Protopia:
Neste mesmo jornal, já detonei com o rebanho sindical, com o rebanho patriótico, com o rebanho dos cordiais, com o rebanho dos honestos. Agora é preciso tosquear o mais importante deles, o maior em sua estupidez, o rebanho eleitoral.
Sobre a pele do burro do tambor nacionalista, sobre o balão dos tamborins republicanos, amarrado as cordas do violão sentimental humanitário, sob o peso dos metais do trompete revolucionário, ali se encontra este saltitante rebanho, seus berros ovinos podem ser ouvidos por toda parte.
“Votem em Ciclano”, “votem em Beltrano”, “votem em Fulano”.
Em cada esquina há cartazes coloridos colocados lá para te lembrar e propagandear a meiguice, a coragem, e a lealdade de qualquer candidato. Estampados estão lá, o esquerdista progressista com um futuro brilhante[1], o ex-ministro economista de grandes caminhos[2], o militar colonialista de pinça e bisturi[3]. Todos eles pintados como grandes exemplos de virtude, honestidade e ternura.
Ainda que qualquer almofadinha poderia conduzir o rebanho desde que seja eloquente, o rebanho eleitoral gosta de elogiar o poder do cajado de Fulano, se impressiona com a força com que chicoteia Ciclano, aplaude as mãos fortes de Beltrano que seguram a corda.
O rebanho pondera e avalia também tudo quanto lhe é prometido; sem ignorar que nunca, jamais, nenhuma das promessas serão cumpridas. Porque é essa a forma que cada eleitor ovino, cada ovelhinha votante, encontrada para dar pra si próprio um pouco mais de ilusão. E os políticos seguem lhes prometendo a Lua, a felicidade, a diminuição dos impostos, a liberdade, estes e tantos outros devaneios nos quais ninguém acredita, mas que convém ao eleitorado fingir que tudo é possível e será realizado, fingir acreditar é o passa-tempo do rebanho.
Se maravilham os ovinos com as ilusões que lhes oferecem os aprendizes de pastoreio, depois de escolher o paraíso prometido sentados em um sofá ou numa mesa de bar. Mas no governo dos nacionalistas ou dos socialistas, os dados mostram o contrário. Dados que as ovelhas uma vez mais fingem ignorar.
Abrem as portas de suas casas, sentam-se a sala para ouvir religiosamente o orador-candidato que – em troca de pequenos débitos reformistas – promete e anuncia o reino da felicidade futura. E as ovelhas abrem suas bocas e orelhas para pastar um pouco mais.
– Prometo que banquetes de restos cairão em pedaços dentro de suas bocas! Suas casas velhas serão transformadas em palácios!! E vocês terão renda para viver sem trabalhar por trinta anos!!! – Diz o candidato.
– Ah! Ah! Que maravilha! Que maravilhas nos diz esse homem! É mentira o que está nos contando, porém nos faz tão bem, poder acreditar por um momento que será verdade. – Diz o eleitor.
As vezes pode acontecer que outro candidato lhe interrompa os sonhos para dizer:
– Isto não está certo! Vote em mim e prometo que banquetes de sobras cairão já ruminados dentro de suas bocas! – E o oviário segue atento ao debate apaixonante – Em pedaços ou ruminados? Como será preparado este banquete de sobras que jamais comerão?
Referências
- ↑No original faz referência à Alfred Léon Gérault-Richard, jornalista e parlamentar socialista francês(N.T.)
- ↑No original Maurice Rouvier, banqueiro, político e republicano francês(N.T.)
- ↑No original a alusão é feita ao general Jean-Baptiste Marchand (N.T.)